Conceição Lima – Mátria

Conceição Lima, nascida em 1961, é natural de Santana, Ilha de São Tomé. Formou-se jornalista em Portugal, sendo também licenciada em Estudos Afro-Portugueses e Brasileiros pelo King’s College londrino. Além disso, tem uma especialização em Governos e Políticas em África e um mestrado em Estudos Africanos, ambos pela School of Oriental and African Studies (SOAS) de Londres. Reside em Londres, onde trabalha na BBC como produtora de programas de Língua Portuguesa. Suas obras incluem “O Útero da Casa” (2004), “A Dolorosa Raiz do Micondó” (2006), “O País de Akendenguê” (2011) e “Quando Florirem Salambás no Tecto do Pico” (2015).

O poema que aqui transcrevemos, “Mátria“, está no livro “O Útero da Casa”.

Mátria

Quero-me desperta
se ao útero da casa retorno
para tactear a diurna penumbra
das paredes
na pele dos dedos rever a maciez
dos dias subterrâneos
os momentos idos
Creio nesta amplidão
de praia talvez ou de deserto
creio na insônia que verga
este teatro de sombras
E se me interrogo
é para te explicar
riacho de dor cascata de fúria
pois a chuva demora e o obô entristece
ao meio-dia
Não lastimo a morte dos imbondeiros
a Praça viúva de chilreios e risonhos dedos
Um degrau de basalto emerge do mar
e nas danças das trepadeiras reabito
o teu corpo
templo mátrio
meu castelo melancólico
de tábuas rijas e de prumos

(LIMA, 2004, p. 17-18)

Sobre o título do poema, vale reproduzir o comentário de Roberto Pontes (Universidade Federal do Ceará), para quem o “(…) título é muito expressivo porque se os dicionários registram o adjetivo mátrio, criado no século XVII pelo Pe. Antônio Vieira, por analogia com pátrio, não acolhem o uso de mátria como substantivo, na perfeitamente cabível analogia com pátria. O poema, portanto, fala sobre a pátria, mas esta se confunde com a casa que, personificada, tem útero onde se surpreende a “diurna penumbra/ das paredes” e “a maciez/ dos dias subterrâneos/ os momentos idos”. A casa a que o eu lírico retorna tem, pois, a mesma ambientação e mesma propriedade do útero materno.”

Mdou Moctar: vozes tuaregues

Mdou Moctar (nascido Mahamadou Souleymane em 1986), é um compositor e músico tuaregue residente em Agadez, Níger, e é um dos primeiros músicos a realizar adaptações eletrônicas modernas da música tuaregue. Sua fama começou a partir de comerciais para uma companhia de telefones celulares. Desde 2008, lançou cinco álbuns de estúdio, entre os quais se destaca “Ilana: The Creator” (2019) e o aclamado e mais recente “Afrique Victime“, lançado este ano pela Matador Records.
Ele canta em tuaregue, também conhecido como tamaxeque ou tamajaque, termo que abrange um grupo de dialetos e línguas berberes aparentados e mutuamente inteligíveis falados pelos berberes tuaregues em Mali, Níger, Argélia, Líbia e Burquina Fasso.

Suas letras versam sobre o Islã, a educação, o amor e a paz. Ele toca uma guitarra Fender Stratocaster para canhotos e seu estilo de tocar, apesar de utilizar referências de diversos estilos musicais, é notadamente calcado no takamba e no assouf, gêneros populares em sua região natal.

Mia Couto – Venenos de Deus, Remédios do Diabo

“No fundo, o português não era uma pessoa. Ele era uma raça que caminhava, solitária, nos atalhos de uma vila africana”.

(p. 116).

A pandemia do coronavírus, infelizmente, alcançou praticamente todos os cantos do mundo. Junto a isso, um amplo conjunto de imagens, memórias e ficções cotidianas foram tomando forma, sobretudo no que diz respeito a um dos aspectos mais importantes da vida, a saúde, e seu oposto, a doença.

Venenos de Deus, Remédios do Diabo (2008) não é necessariamente um romance sobre esses binários, mas certamente se delineia a partir deles. A epidemia que assola Vila Cacimba, além de uma hecatombe biológica de parca inscrição fora daquele microuniverso social, apresenta um heterogêneo conjunto de saberes acerca da saúde, do padecimento, dos venenos e dos remédios que, num contexto pós-colonial como o de Moçambique, estão sempre marcados pelo choque entre sistemas de pensamento conflitantes.

Ao desembarcar de Lisboa em sua missão de curar a vila de uma epidemia, o doutor Sidónio Rosa veio também em busca da cura para o amor que sente por Deolinda, por quem se apaixonara quando se conheceram na capital portuguesa. Vila Cacimba, no entanto, demonstra ser um universo menos inteligível para ele do que seu próprio coração.

“Sidónio Rosa apenas conhece um caminho no labirinto de atalhos da Vila Cacimba: a ruela que liga a pensão ao posto de saúde e à casa dos Sozinhos. E é esta mesma rua de areia que ele, neste momento, percorre como se fosse um campo minado. Salta à vista: é um europeu nas profundezas de África. O passo é calculado, quase em bicos dos pés, o olhar cauteloso garimpeirando o chão. Ele não confia, a sua sombra não é comandada por ele”.

(p. 75).

Fica aí a nossa primeira sugestão de leitura para estes tempos pandêmicos em que nos estamos metendo. Que a literatura nos cure daquilo que puder.

[evento] A literatura para infância em Moçambique

O 8° Seminário de Literatura Infantil e Juvenil (VIII SLIJ) e IV Seminário Internacional de Literatura Infantil e Juvenil e Práticas de Mediação Literária (IV SELIPRAM): (R)es(x)istências Literárias na Contemporaneidade acontecerá na Universidade Federal de Santa Catarina, no campus da Trindade, Florianópolis, no período de 05 a 08 de novembro de 2019, congregando pesquisadores envolvidos com o estudo da leitura, das práticas educativas construídas em diálogo com a literatura infantil e juvenil e formação do leitor literário.

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Como parte das atrações do evento, a mesa-redonda “A literatura para infância em Moçambique” contará com a presença dos escritores moçambicanos Mauro Brito, Celso C. Cossa e Pedro Pereira Lopes.

Além disso, haverá o lançamento de “O luminoso voo das palavras“, do Mauro Brito, em maravilhosa edição manual da Katarina Kartonera, que há alguns meses completou seu primeiro decênio der atividades, em parceria com o grupo de pesquisa Literalise [Grupo de Pesquisa sobre Literatura Infantil e Juvenil, Centro de Ciências da Educação, UFSC]. Aliás, não é a primeira obra de um moçambicano que a Katarina Kartonera deu à luz. Nunes Zarel•leci (Maputo, 1970) foi o pioneiro com os poemas de seu “Sinapse” (2015).

Data: 5 de novembro, uma terça
Horário: 16:00 às 18:00
Local: Auditório do CCE [Centro de Comunicação e Expressão], Universidade Federal de Santa Catarina.

Entrada franca.

wikiday: Independência da República Centro-Africana (13 de agosto)

Nossos parabéns ao povo centro-africano, que embora esteja hoje comemorando o 54º aniversário de sua independência, vive momentos terríveis por conta de uma guerra civil. Genocídios, disputas étnicas, massacres, enfim, são dias terríveis por lá.

Central African Republic